de tempos em tempos, eu fico meio solitário, parece que é tudo uma imbecilidade, esse homenzinho fajuto todo traumatizado querendo pegar em mãos as tarefas mais importantes, mais insólitas, querendo ser o filósofo espírito livre que passa alguma coisa de realmente interessante pra frente
de tempos em tempos, ainda bem que às vezes demora bem mais que menos, eu fico meio assim, meio chorando toda hora mais pela emoção da cura que pela tristeza da dor, a verdade é que só os mais fortes podem suportar as maiores verdades, porque as grandes verdades são especialmente dolorosas, especialmente horripilantes pra gente que passou a vida acreditando que aquilo que se falava por aí oficialmente devia ser real
pelo menos eu posso desabafar despreocupado com a pontuação ou a semântica, afinal como já disse antes ninguém lê e se alguém lê é aquele excepcional que não vai se sentir ofendido por no caso estar categoricamente inserido no grupo que chamo de ninguém
é triste a gente dedicar a vida às sintonias da eternidade e aos poucos se dar conta do quanto lutaram contra meu esforço, do quanto me disseram que isso tudo era uma estupidez sem tamanho, que tudo que eu escrevo era ou complicado demais, ou chato ou tedioso ou presunçoso ou um pouco de tudo isso junto demais, perdoe-me a alegria do jejum prolongado mas é duro a gente querer a mais profunda honestidade emocional e psicológica e por fim estar sempre batendo de frente com os muros e muralhas que colocam em nossa frente
mas tudo bem, porque eu pedi mesmo por isso, eu já sabia que se quisesse pensar do meu jeito, me dar o tempo de sentir o que está havendo dentro de mim pra poder fazer alguma de mais interessante praquilo que está fora de mim, era óbvio que isso ia exigir alguma dor, alguma dor especialmente confeccionada praqueles que sofrem por se dar conta do desperdício que é o ser humano sobre a terra nesse momento
a maioria sofre porque se apaixonou sem reciprocidade, ou porque o amor que pulsava se esvaiu e falta coragem pra recomeçar, ou porque não sabe aonde vai parar a conta bancária ou se o plano odontológico vai cobrir esses diachos de rombos que arranjamos com todos esses suspiros venenosos do açúcar branco como avental de açougueiro
eu bem sabia, desde o princípio já suspeitava se é que me entende, que essa coisa toda de tentar entender o mundo, de pesquisar a história por detrás das histórias, de desvendar os segredos do coração, casar a ciência e a religião, unir o holístico, o místico, o censurado, o orgásmico, eu bem sabia que essa coisa toda de buscar ao máximo viver o máximo que se possa viver com certeza cedo e ou tarde ia e vinha teria sempre alguma solidão triste pra me fazer questionar tudo
questionar minha utilidade no mundo, bom isso já pouco importa, tem um tempo que desisti de me convencer que ser útil é o derradeiro propósito desse tal de homem, útil é o escravo pro amo, a ferramenta pro mecânico, a terra pro fazendeiro, útil é o que cause interesse direto relativo ao bem-estar, geralmente considerado daquela maneira superficial, em que o bem-estar é poder beber, dormir e trepar sem um patrão pra aporrinhar, mas isso pra mim são só as férias do demente que se permite ser criança irresponsável por duas semanas ao ano, se ele não vender pra empresa enfim essa pequena vacância que permitiria o solução de inconsequência que todo bom cidadão registrado e remunerado tanto anseia no que se arrasta sua existência de responsabilidade pra com ditames que ele está longe, ah tão longe de ser o idealizador
quem sabe se viver idéias e ideais alheios seja realmente mais confortável, pegar pronto o que dão de bandeja sem se perguntar se as moscas na cozinha trariam algum malefício, sem pensar onde teriam estado as mãos do carregador que lhe vem entregar o biscoito da sorte premeditado, redigido em masmorras do mercantilismo abestado
ninguém se importa realmente, ninguém vai vir me dar um cafuné a essa altura, então eu me abro pra Deus, que sabe bem me curar, essa solidão é só uma palavra besta pra quando a gente não se enxerga muito bem na companhia da inteligência criativa essencial, se eu chorei à toa sei que Ele me perdoa, e o mesmo pra quando rio fora de hora, porque nesse mundo parece mais certo se conter e suprimir do que se expor pra tentar amar
talvez elas que têm medo, estão muito machucadas, já não podem entender os desígnios indigestos do maltrapilho descabelado que carrega perspectivas bastante inéditas sobre o encaminhamento da humanidade, talvez elas têm ódio, é o que costumo ver, ódio pela sinceridade que não sei economizar, ódio por afinal receber aquilo que é belo que vem da vida, me odeiam porque eu sinto que é bonito mas dói demais se eu falar assim isso bem alto e claro
porque o que é bonito está de saco cheio do fato de ser bonito, está difícil de argumentar, mas está certo mais que certo, elogios e recriminações são tão vazios quanto as orações que pedem por uma resolução instantânea de todos os problemas, não é vida sem problemas e Deus se veste alguma roupa é bem descolada de professor motoqueiro maconheiro que ensina tudo na prática e não poupa palmatórias aos seus lobos desgarrados, as lições vêm devagarinho, mas pra aplicá-las tem que ser esperto, aprender aprendemos rapidinho, treta é colocar em ação do tal jeitinho sem pestanejar, fazer de cada nova decisão na alma a restauração, a sustentação, o lar

2 comentários:

Lou Prates disse...

é melhor aceitar a dor do que evitá-la... ela passa como o rio, que não se pode apressar: ele flui por si mesmo.

Gabriela disse...

De tempos em tempos toda euforia cansa, exatamente como todos os de tempos em tempos... às vezes corro dessa centrífuga poesia, inútil esforço se minha escrita é também respirar... pois também quero correr das idéias formadas e que vão se formando no mundo, como se isso fosse possível estando nelas, à surfar. Escorrego pela beirada de todo sorvete, porque é doce. Tiro o açúcar do café por três dias, o café com açúcar me parece alienígena. Mudo meu paladar. Me pergunto o quão forte eu sou, se nada sou que senão a onda berrante por dentro de meu corpo... de tempos em tempos eu te leio, aqui ou ali, o risco é sempre velejar...porque escrita é caminho sem volta, volto e sinto tudo como tudo que se tem todo ser ao expressar...sim, o universo é um trem cumprido, e a gente fala pelos cotovelos.