quando eu nasci
um arcanjo surfista veio me descendo a crista
benzeu de água salgada e sumiu de vista

vai flor me empurravam
embeleze o mundo dê razão à sua dor
invente valor que aprecie a procissão

quando eu nasci
um diabo bem intencionado vinha rodopiando
banhou de estrelas e pó de ensandecionismo

vem vou lhe dar juízo
abraçou com suas asas de trevas
veio mostrando minha luz que vinha de dentro

ensinou mais a ousar e espernear
educação moderada minhas mães que encucassem
pois dos pais era lenha em brasa e chuva de meteoritos

me cingiram de detritos
coroa avessa de rei da intemperança
logo destronado fiz fundir no caldo a aliança

quando eu nasci
um arcanjo surfista veio me descendo a crista
cheirava bem a cânhamo sândalo e plasma de escaravelhos

era o dia de todos os joelhos
debaixo do sol estalavam os revérberos do oriente
em pontes estaiadas nos zênites da paciência

rolavam os fios de ouro da cadência
o espírito rugia os sonhos inacabados
pelas esquinas mil destinos atravessados

eu ia reunindo meus estilhaços
pegando e tirando onda
amadureci no tal compasso

quando eu nasci
um diabo bem humorado vinha se balançando
batizou da taça de lágrimas guerreiras

me fez cócegas com sua malícia
provou que a vida surfista minha
só inteiramente liberta seria uma delícia

por fim me vi ao espelho
não era anjo nem demônio
era apenas um velho artista com seu sonho

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